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Era por volta de 2 horas da madrugada de 6 de setembro de 2023 quando a comunidade do bairro Monte Cristo, na região continental de Florianópolis, foi surpreendida pelo rompimento de um reservatório da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan). O acidente destruiu casas, desabrigou famílias e deteriorou veículos. 

Desde então, o MPSC ingressou com ações judiciais para a responsabilização cível e criminal dos envolvidos e para o ressarcimento de cidadãos e do poder público. Obteve, inclusive, o bloqueio de mais de R$ 16 milhões e a interdição de outro reservatório, no Município de São José, que apresentava fissuras.

Agora, o Ministério Público dá um importante passo na prevenção de ocorrências semelhantes, assim como na mitigação de danos caso voltem a acontecer, com a assinatura de um termo de ajustamento de conduta com a Casan nesta quarta-feira (4/9). O acordo, proposto pela 7ª Promotoria de Justiça (com atuação na área da moralidade administrativa) e pela 29ª Promotoria de Justiça (área do consumidor) da Comarca da Capital, prevê a criação de mecanismos para a prevenção e o ressarcimento de possíveis danos, a fim de que se tenha um plano para ser aplicado em casos de acidentes (procedimento padrão), assim como um canal direto para a população em casos de emergência. 

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Para o Promotor de Justiça Rafael de Moraes Lima (7ª PJ), "graças à parceria com o TCE e atuação conjunta com a Promotoria de Defesa do Consumidor, contando com a compreensão e adesão da CASAN, foi possível chegar ao TAC para adoção de medidas que busquem evitar que a tragédia do reservatório do Monte Cristo se repita, bem como para que sejam intensificados maiores controles, por parte da empresa, durante a execução de obras públicas". 

O Promotor de Justiça Wilson Paulo Mendonça Neto (29ª PJ) destaca que na esfera cível, no âmbito do Direito do Consumidor, a preocupação com novos eventos levou a previsão da criação de planos preventivos e de contingência para padronizar as ações a serem tomadas pela concessionária. Nas demais áreas, buscou-se a responsabilização das pessoas envolvidas. "O TAC firmado nesta data é um avanço, sem dúvida, para prevenção de novos eventos com mecanismos que vem ao encontro da efetiva proteção do consumidor, com abrangência estadual e permitindo, portanto, uma melhor fiscalização dos contratos, anteriores e novos", completou. 

Já o Diretor-Presidente da Casan, Edson Moritz Martins da Silva, relembrou da tragédia e das ações promovidas para mitigar os danos e atender a comunidade atingida. "Criou-se um novo paradigma, a Casan de hoje é uma empresa diferente do que era antes", disse. Ele destacou, ainda, que há compromissos firmados no acordo com o MPSC que já estão em curso e sobre a importância de tê-los registrados documentalmente. 'Firma-se uma regra, que fica para os gestores futuros", completou. 

As obrigações da Casan no acordo 

  • Vistorias periódicas anuais: A Casan deverá vistoriar anualmente todos os seus reservatórios ativos, com a elaboração de relatórios e a emissão de ART indicando as condições de cada um, a serem disponibilizados, anualmente, até o dia 20 de março, em seu portal da transparência. Caso necessário, o Ministério Público poderá requisitar informações complementares, que deverão ser apresentadas em prazo a ser fixado. 
  • Plano preventivo: A Casan deve criar um plano preventivo com uma equipe especializada, estabelecendo procedimentos para prevenir acidentes. O plano deve incluir limite de obras fiscalizadas por fiscal, capacitações anuais para fiscais, plano de segurança para reservatórios, sistema de controle de documentos das obras, organização e armazenamento de diários de obra e sistematização do controle de documentos usados na fiscalização. A empresa tem 180 dias para a elaboração do plano. 
  • Plano de contingência: Também em 180 dias, a Casan deverá elaborar um plano de contingência para desastres naturais ou catástrofes, visando minimizar danos e responder prontamente às pessoas afetadas. O plano deve incluir procedimentos para apuração de prejuízos, indicação de equipe técnica para diagnóstico emergencial, parâmetros para ressarcimento de terceiros, documentação da área atingida, plano de resgate emergencial, provisão de alimentos e água, atendimento médico e psicológico, comunicação às autoridades competentes e medidas para preservar a saúde e segurança da população. 
  • Canal de atendimento: A Casan deverá instituir um canal de atendimento específico, com disponibilidade via telefone, correio eletrônico e WhatsApp, para atendimento direto ao cidadão em caso de urgência ou emergência, conforme previsto e definido no plano de contingência. 
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MPSC presente desde o primeiro momento 

No mesmo dia do rompimento do reservatório, 6 de setembro de 2023, a 7ª Promotoria de Justiça e a 29ª Promotoria de Justiça instauram inquéritos civis para apurar os fatos e a responsabilidade pelo ocorrido. Imediatamente os Promotores de Justiça requisitaram uma série de informações e perícias a fim de esclarecer os fatos, quantificar o número de atingidos e a extensão dos prejuízos e apurar se houve omissão por parte de agentes públicos na fiscalização da construção do reservatório, que se rompeu menos de dois anos depois de pronto.  

Em 25 de setembro, o Ministério Público e o Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE/SC) uniram esforços e formaram uma força-tarefa para a apuração criminal, cível e administrativa dos fatos que envolvem o rompimento. Na ocasião, o Procurador-Geral de Justiça, Fábio de Souza Trajano, e o Conselheiro-Presidente do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina, Herneus De Nadal, assinaram uma portaria conjunta a fim de otimizar esforços e recursos das duas instituições. 

O Diretor-Geral de Controle Externo do TCE/SC, Sidney Antônio Tavares Júnior, também presente na assinatura do cordo entre MPSC e Casan, destaca que, para o Tribunal de Contas, a força-tarefa com o Ministério Público foi de especial importância para a troca de experiências, cada um agindo conforme as suas competências. "Com tanta gente afetada, essa soma de esforços claramente visa dar uma resposta ao cidadão, trazer a responsabilidade para aqueles que deram causa e, além disso, preservar ou economizar dinheiro público e dar um resultado melhor para a sociedade", considerou. 

"A Força Tarefa foi muito importante para levantar os dados técnicos necessários que permitiram ao Ministério Público chegar a responsabilização dos envolvidos", avaliou Mendonça Neto. "A Força Tarefa com o TCE foi fundamental, desde a descoberta das causas da tragédia, até a definição dos responsáveis, os quais estão respondendo às ações judiciais movidas pelo Ministério Público", completou Moraes Lima.

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As ações judiciais 

A primeira ação a ser ajuizada pelas Promotorias de Justiça foi uma ação cautelar, no dia 29 de setembro de 2023. Tratava-se de uma ação cautelar, que tinha por objetivo obter tutela antecipada a fim de evitar uma eventual dissipação do patrimônio da empresa e de seus sócios-proprietários para garantir o ressarcimento da comunidade atingida e do poder público. 

No dia 2 de outubro, a tutela antecipada foi deferida, determinando o bloqueio de bens da empresa e de seus sócios-proprietários até o valor de R$ 16,6 milhões. 

Em 22 de janeiro de 2024, as Promotorias de Justiça ajuizaram uma ação civil pública para cobrar mais de R$ 19,5 milhões da construtora para cobrir danos causados por rompimento de reservatório da Casan - R$ 16,6 milhões já estavam, inclusive, bloqueados cautelarmente. "Na ação de indenização, nós buscamos a reparação dos danos sofridos, não só pela mas também por terceiros interessados, assim como os demais órgãos públicos que tiveram despesas em relação às primeiras tratativas para minorar os danos que ocorreram no acidente", explicou Mendonça Neto. A ação, que está em trâmite, detalhou as causas do colapso do reservatório. 

O que deu causa ao rompimento do reservatório, entregue pela construtora menos de dois anos antes da tragédia, foi a má execução da obra. A causa foi apontada por quatro laudos/pareceres técnicos apresentados pelo Centro de Apoio Operacional Técnico do MPSC, pelo TCE, pela Polícia Científica do Estado e pela Auditoria da própria Casan.   

Resumidamente, algumas conclusões foram extraídas a partir das perícias: a empresa Gomes & Gomes Ltda. executou a obra do reservatório de Monte Cristo em desconformidade com o projeto estrutural, e isso foi determinante para o colapso de maneira abrupta do reservatório. Foi constatado que construtora utilizou ferros das armaduras dos pilares de apoio em desacordo com a indicação do projeto original (eles tinham 5 milímetros de diâmetro, enquanto o projeto previa o dobro do tamanho, isto é, 10 milímetros de diâmetro). 

No dia 19 de agosto deste ano, foi a vez de as Promotorias de Justiça buscarem a responsabilização criminal pelo ocorrido. Nessa data foi ajuizada a denúncia contra os dois sócios-proprietários da empresa Gomes & Gomes Ltda., que construiu o reservatório que se rompeu no bairro Monte Cristo, e um dos engenheiros da Casan responsáveis pela fiscalização. A ação foi recebida pela Justiça no dia 28 de agosto, o que torna os três acusados réus na ação penal. Outros dois engenheiros da Casan que também atuaram na fiscalização da obra não foram denunciados em razão de terem aceitado um acordo de não persecução penal proposto pelo Ministério Público. 

As Promotorias de Justiça ajuizaram, ainda, uma ação civil pública por ato de improbidade administrativa, ainda não recebida pelo Poder Judiciário. "Esta demanda judicial tem por escopo buscar a responsabilização dos agentes públicos e dos particulares pela tragédia ocorrida, com aplicação das penas previstas na Lei de Improbidade Administrativa e versa sobre a omissão na fiscalização da execução da obra pública", esclarece o Promotor de Justiça Rafael de Moraes Lima.

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Atuação extrajudicial do MPSC interditou outro reservatório para reform 

No dia 8 de abril deste ano, a 7ª e 29ª Promotorias de Justiça da Capital, com auxílio do Centro de Apoio Operacional Técnico do MPSC e com Auditores Fiscais de Controle Externo do TCE, fizeram uma vistoria no Reservatório Irineu Comelli, em São José, o qual apresenta fissuras em uma das estruturas. A estrutura vistoriada foi construída pela mesma empresa que fez o reservatório que se rompeu no bairro Monte Cristo, em 6 de setembro de 2023, e faz parte do mesmo contrato com a Companhia de Águas e Saneamento.   

Em 17 de abril, de posse dos laudos da vistoria, que atestaram possível risco potencial de rompimento da estrutura e apontando, por precaução, a necessidade de esvaziamento e interdição até a conclusão de estudos mais aprofundados, as Promotorias de Justiça recomendaram à Casan a interdição de uma das três estruturas do reservatório. A Casan no dia 23 de abril acolheu a recomendação e a estrutura foi interditada.

Após, uma perícia contratada pela Casan, chegou-se à conclusão da segurança estrutural do reservatório, sugerindo a realização de algumas obras e reformas para melhoria das condições, a fim de operar a estrutura de modo seguro para a sociedade.