O Supremo Tribunal Federal (STF) atendeu a requerimento do Ministério Público de Santa Catarina e reconheceu a repercussão geral de recurso interposto pela Coordenadoria de Recursos Criminais (CRCrim) do MP catarinense, que versa sobre a aplicabilidade da vedação às saídas temporárias, instituída pela Lei nº 14.843/24, na execução de pena por crimes praticados antes de sua vigência.
Com o reconhecimento da repercussão geral da questão, todos os recursos extraordinários que versam sobre a matéria passam a ser sobrestados, aguardando o julgamento do recurso paradigma. Vale destacar que já foram interpostos mais de 100 recursos extraordinários pela CRCRIM acerca dessa matéria.
A Lei nº 14.843/2024 alterou o art. 122 da Lei de Execuções Penais para impedir as saídas temporárias ou trabalho externo sem vigilância direta (uso de tornozeleiras eletrônicas) do condenado por crime hediondo ou com violência ou grave ameaça contra pessoa; e a saída temporária sem vigilância direta para visita à família e para participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social, independentemente da natureza da infração penal praticada.
No recurso extraordinário, a CRCRIM se insurgiu contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), no qual se entendeu que as proibições à saída temporária trazidas pela Lei nº 14.843/2024 representam verdadeira novatio legis in pejus, princípio jurídico que proíbe a retroatividade de leis penais mais gravosas, garantindo que uma lei mais severa não possa ser aplicada a crimes cometidos antes de sua vigência. Nas razões recursais, a CRCRIM pugnou pelo indeferimento do benefício da saída temporária ao apenado, aplicando-se de imediato as alterações trazidas pela Lei nº 14.843/2024, ainda que por fatos praticados antes da sua vigência. Isso porque não se pode cogitar verificar a implementação dos requisitos atinentes à saída temporária tendo como base a data do cometimento do crime, justamente por não se tratar de um direito objetivo (sujeito à vedação do art. 5º, XL, da CF), e sim de um instituto processual atinente ao processo de execução penal, cuja aplicabilidade deve ser aferida quando o direito é implementado, ou seja, no momento em que os requisitos são preenchidos pelo apenado.
Ao submeter o aludido recurso para análise no Plenário Virtual da Corte Constitucional, o Ministro Presidente do STF, Luís Roberto Barroso, se manifestou favoravelmente ao reconhecimento da repercussão geral do recurso, sintetizando a controvérsia: ''O que está em discussão, portanto, é se haveria retroatividade de lei mais gravosa vedada pela Constituição. Isso porque, de um lado, o acórdão afirma que haveria retroatividade, porque o regime legal incidente seria aquele definido pela data do cometimento do ilícito criminal. De outro lado, a parte recorrente afirma que não haveria retroação, já que o regime legal seria aquele vigente no momento de reunião dos requisitos para os benefícios de saída temporária e trabalho externo''.
O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada pelo Ministério Público de Santa Catarina.